sábado, 21 de março de 2015

Sobre a suposta superioridade "moral" da Ditadura Militar

Muitos argumentam que na Ditadura Militar não havia tanta corrupção, criminalidade e violência.

No que diz respeito à corrupção, vamos desmistificar. Havia sim, MUITA CORRUPÇÃO.

Em seguida, vamos dar algum mérito aos gorilas de farda pela explosão de violência que vivemos nos dias de hoje.


'O que os olhos não vêem, o coração não sente', diz o ditado.


Um embaixador denunciou que houve super-faturamento nas obras de Itaipu, mas foi assassinado em 1979. Recentemente, um executivo da Camargo Corrêa admitiu que distribuiu propinas para políticos no Brasil por quarenta anos (ou seja, iniciou sua carreira em pleno regime militar).

Outros casos de corrupção na Ditadura envolvendo figuras do alto escalão e parentes de generais foram denunciados pelo jornalista e escritor J. Carlos de Assis, mas sem qualquer apuração por parte do Estado ou da grande mídia. Aliás, enquanto denunciantes eram calados pela censura (ou por assassinato), a grande mídia apoiava o regime. Ou seja, as pessoas tinham a impressão de que não havia sujeira pelo simples fato de que ela era toda varrida para debaixo do tapete.

Para se ter uma ideia do nível em que o poder público e os interesses privados estavam misturados (síntese da corrupção), vejam o que escreveu Alexandre Barros (1991, p. i-ii), especialista em lobby empresarial que se notabilizou como teórico durante a Ditadura Militar e vive desde a década de 1980 como consultor de empresas e “embaixadas” (sic) (BARROS, 1991):

"Nos tempos do regime militar, dada a alta concentração de poder, as empresas podiam limitar-se a conversar com dois ou três burocratas e conseguiam, de uma forma ou de outra, resolver seus problemas.

A partir da redemocratização o processo ficou mais complicado e passou a envolver muito mais gente".

São palavras encontradas em um livrinho muito interessante chamado "Lobby - Como fazer o governo trabalhar para a sua empresa... legalmente".


A Reforma Agrária que não aconteceu e o crescimento do crime organizado, tudo a ver.

Quanto à violência e criminalidade, para além do fato de que a tortura de prisioneiros políticos era política de Estado (tendo sido justificada como "necessária" por Geisel), é importante observar que os militares deram grande contribuição para o processo de favelização das grandes cidades. A maioria da população das favelas desde sempre foi composta por trabalhadores, mas o abandono dessas pessoas à miséria e a ausência do Estado nesses locais (à exceção de seu braço armado, a polícia) propiciaram o surgimento de um poder paralelo, o crime organizado que explodiria nos anos seguintes.

Rio de Janeiro, 1983. Uma foto que ilustra bem a relação entre o Estado e o povo pobre, negro e morador da periferia. Tal relação não se inaugurou com o Regime Militar nem foi dissolvida com o fim dele. Isto é herança do sistema escravocrata. Ainda existem abusos do Estado, racismo e graves violações dos direitos dessa população. Embora os militares não sejam os únicos responsáveis por esta cena, as grandes cidades poderiam ter sido organizadas de outra forma caso a Reforma Agrária proposta por João Goulart em 1964 tivesse sido levada a cabo.
Explico a responsabilidade dos milicos: uma das principais consequências do Golpe de 1964 foi o impedimento da Reforma Agrária proposta por João Goulart. Sem Reforma Agrária (que os países capitalistas mais desenvolvidos do mundo fizeram, mas por aqui dizem que é coisa de comunista) o processo de industrialização do campo e urbanização no Brasil foi concluído com intenso êxodo rural. A população migrava do campo para as cidades e era recebida em condições precárias. O descaso das autoridades obrigou essas pessoas a improvisarem moradias nos arredores das cidades, muitas vezes em áreas íngremes.

Para piorar, os salários na nova vida urbana eram baixíssimos - e quando  corrigidos, era abaixo da elevação do custo de vida. As taxas de inflação foram altíssimas durante vários anos da Ditadura. Aquilo sim era carestia.

E pensar que a pequena-burguesia de hoje faz do preço da gasolina argumento para um "impeachment".




Referências

"Meu pai sabia demais": http://www.brasilpost.com.br/2015/03/19/morte-jose-jobim-corrupcao-itaipu_n_6898294.html?ncid=tweetlnkbrhpmg00000002 

O homem da mala da Camargo Corrêa: http://www.istoe.com.br/reportagens/407824_O+HOMEM+DA+MALA+DA+CAMARGO+CORREA 

Corrupção e a ditadura militar: http://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/corrupcao-e-a-ditadura-militar 

A grande imprensa apoiou o golpe e a ditadura: http://www.cartacapital.com.br/politica/a-grande-impressa-apoiou-o-golpe-e-a-ditadura-e-nao-teve-papel-relevante-para-o-fim-do-regime-1979.html 

Documentos revelam mortes à sombra dos militares 48 anos após o Golpe Militar: http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2012/03/31/interna_politica,286509/documentos-revelam-mortes-a-sombra-dos-militares-48-anos-apos-o-golpe-militar.shtml 

Reforma Agrária e o Golpe de 1964 - imaginar o passado para projetar o futuro: http://terradedireitos.org.br/2014/04/01/mst-reforma-agraria-e-o-golpe-de-1964-imaginar-o-passado-para-projetar-o-futuro/ 

Social antes do individual - Reforma agrária já!: http://www.oocities.org/sulanca/refagr.htm 

O Outro Lado do "Milagre Econômico" - Exploração e Repressão à Classe Trabalhadora Brasileira: http://historiaehistoria.com.br/materia.cfm?tb=alunos&id=474 

Inflação e dívida pública explodiram no Brasil ao final da ditadura militar: http://www.r7.com/r7/media/2014/20140331-info-ditadura/20140331-info-ditadura.html

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